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Uma Lágrima no Canto do Olho

  • PJ Vulter
  • 8 de jun. de 2018
  • 3 min de leitura


Esta manhã chorei…


Ia a conduzir e a ouvir a emissão de rádio e – do nada – senti as lágrimas a assomarem-se e chorei. Porque chorei eu?


Não sei. E esta é a mais pura das verdades…


É claro que, se me puser a pensar, poderei evocar uma série de razões para ter chorado, porque todos nós temos razões para chorar. O que acontece é que alguns de nós somos gente de lágrima fácil e outros não tanto; tal como para alguns – poucos, com certeza – o choro aceita-se, enquanto para outros combate-se. E, por esta natureza de cada um, todos nós teremos uma percepção diferente do que nos faz chorar – ou merece ser chorado - e do que faz chorar os outros. E digo isto, passando já à frente do conjunto de normativas sociais, tácitas e não tácitas, sobre o choro.


«Um homem não chora!»


Na minha família materna, todos os homens são chorões. Lembro-me do meu falecido avô… Quantas e quantas vezes fui dar com ele, em frente à televisão, de lágrimas no rosto e com o lenço de pano amarrotado na mão; «Comovi-me!», dizia-me ele.


Chorar é mágico.


Chorar é transformador…


Chorar pode transmutar um momento de sofrimento em algo mais tolerável e, nesse movimento, permitir que se comece a recuperar desse mesmo sofrimento; a lágrima, desde que sincera, é catalisadora ou catártica.


E porque falo disto?


Bom; porque chorei e não sei porquê…


Quando assim é, quando o choro não é resultado disto ou daquilo, é um processo de libertação; é a súmula do conjunto de situações e sentimentos que se somatizou numa crise de choro, a maior parte das vezes, inesperada e – acreditamos – sem causa aparente. É – se quisermos – um processo biológico automático para libertar o corpo dos factores que o poderão fazer adoecer.


É já conhecido, embora ainda não mainstreem, que as emoções negativas fazem-nos adoecer; não diretamente, claro está. No entanto, encontram-se provas contundentes, ainda que o mainstreem da saúde o que queira ignorar – e ignore -, que a tristeza, as preocupações e o stress reduzem a nossa resistência e resiliência à doença. Como?


Simplesmente porque estudos revelaram que pessoas com sintomatologia associada à depressão apresentam um sistema imunitário deficitário e logo permeável.


Portanto, a Natureza - que é sábia - deu-nos um instrumento que nos permite transmutar os nossos estados débeis em estados menos débeis e dessa forma adoecermos menos: o choro. Mas, como em tudo o que a humanidade não entende, criaram-se um conjunto de regras, tácitas e não tácitas, sobre como chorar; a fim de se aceitar melhor aquilo que não se entende. E, respeitando essas regras, depois de adultos, temos muito poucas oportunidades para chorar e até desejamos que sejam poucas…


E o que fazemos àquelas pequenas coisas que nos vão sucedendo, mas que não merecem – de acordo com as regras – uma lágrima?


Nada. Essas pequenas coisas vão-se acumulando, umas em cima das outras; vão-se ignorando: todos nós construímos verdadeiras Torres de Babel, mal-arranjadas e periclitantes, com essas pequenas coisas.

E, um dia, por força do peso dessas pequenas coisas, há uma delas, provavelmente já esquecida ou quase irrelevante, que resvala e manda a Torre ao chão. E é aí, quando levamos com a Torre de Babel em cima, que as coisas se descontrolam…


Quem é de lágrima mais fácil, chorará. Contudo, «Um Homem não chora!» e esse sabe-se lá o que fará… Talvez pegue uma faca e esfaqueie umas quantas pessoas pela rua. E porquê?


Porque alguém com esse mindset, alguém que tenha sido perfeitamente socializado na cultura social do choro, não saberá que poderá chorar; atribuirá a culpa a alguém, ou alguma coisa, e então vai vingar-se, porque há culpas atribuídas – e mal - pelo seu mau estar.


Todavia, uma prática saudável do choro torna-nos mais felizes. Chorar, quando sentimos vontade de chorar, liberta-nos da dor e da mágoa, e, mesmo que chorar não seja possível - seja por que razão for -, quando o choro vier, que venha; e aproveitemo-lo, porque é para o nosso bem.

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