Fogo de Vista
- PJ Vulter
- 9 de nov. de 2018
- 3 min de leitura

Não sei como é convosco… Mas eu sempre fui uma pessoa tímida. Neste momento sou muito mais extrovertido; ainda assim – pelos padrões – sou uma pessoa tímida…
Isto significa que não gosto de grandes exposições, não aprecio estar na ribalta e nem ser o centro das atenções. Como tal, o meu perfil social é o de uma pessoa discreta por quem pouco se dá; alguém que está lá, mas não incomoda nem aborrece.
Mas isto não significa que eu seja menos do que qualquer outro. E, muito menos, que qualquer outro – só porque parece estar sempre ligado à corrente – seja mais do que eu…
No entanto, o que acontece com frequência é que são essas as pessoas que acabam por ter destaque, ser vistas e lembradas. E é normal, porque elas lutam por isso; não fazem outra coisa…
Essas pessoas estão permanentemente em ebulição. Tudo aquilo que conseguem fazer é um espectáculo de competência, um sinónimo de esforço e empenho hercúleo; e tudo aquilo que acontece de menos bom é uma tragédia vivida no fio da navalha como se a própria vida dependesse disso. Mas atenção: não estou a dizer que é essa a leitura dos outros. O que estou a dizer é que é assim que essas pessoas fazem os outros viver as coisas…
O resultado daquela atitude é a ilusão da excecionalidade, essa aura de seres geniais que ostentam perante os restantes meros mortais; muitas vezes, muito mais competentes e produtivos. E de repente, nós, aqueles que cumprimos com o nosso papel, cientes do nosso lugar e não querendo nada mais do que o nosso merecimento, somos espoliados até disso, porque de discretos passamos a invisíveis; e o nosso saber – muitas vezes, de anos – de nada pesa perante esse outro brilhante ser que surge todos dias – pela manhã – no horizonte… Como um sol da Disney!
Por mim passam, todos dias, pessoas assim. Eu vejo-as. Passam horas ao telefone com os amigos a falar de como são excecionais, ou a conversar com os colegas sobre como seria bom isto ou aquilo… E, durante esse tempo, eu trabalho; faço o meu a tempo e horas, nas calmas, porque privilegio esta abordagem. Todavia, no final do dia, esses seres brilhantes - que atalharam metade da jornada com actividades não produtivas -, num sprint, fazem um quarto do trabalho que lhes competia e, quando o terminam, fazem um festim e, por isso, para o resto do mundo fizeram um brilharete, um esforço descomunal e merecem um prémio…
Para quando ficará o ser humano desperto para isto?
Ainda vai faltar muito tempo, porque criou-se o mito de que todos temos de nos «vender»; todos temos de nos fazer mais do que aquilo que somos, pois só assim poderemos estar acima da concorrência. Mas com isto criou-se um ciclo vicioso de perversidade…
Há pessoas que são maravilhosas a «vender-se»; algumas até foram abençoadas pelos genes e vierem com um embrulho bonito – dão nas vistas. E estas até têm vida facilitada… Mas há também as outras, menos lustrosas, que sabem «vender-se» muito bem… E depois há todos os outros que não têm dons comerciais…
E - perdoem-me, pois cada um fala da experiência que tem –, regra geral, as gentes «vendáveis» são apenas um pacote vazio, um embrulho cheio de ar, uma bombinha de Carnaval, fogo-de-artifício… Se lhes tirarem o palco, ou o público, apagam-se como uma brasa esquecida na braseira, pois apenas vivem para o parecer – parecer aos outros.
Tenho fé que a evolução, e crescimento humano, nos ensine que o mais importante é ser-se o que se é e não querer parecer aquilo que achamos que temos de ser por acreditarmos que é isso que querem que sejamos. Confuso?
Acho que não…
E vem tudo isto a propósito de não me terem dado um rebuçado…
A semana passada, andei louco, de um lado para outro, a ajudar toda a gente – e não, não era esse o meu trabalho; mas quem recebeu o rebuçado?
O Sol da Disney!
O mesmo Sol da Disney que não ajudou ninguém, mas soube dizer – depois de ter sido ajudado por mim: «Ufa! Finalmente já consegui!», como se o esforço e o mérito do resultado fosse dele.
E a mim?
A mim nem me perguntaram se queria…
Isto até pode parecer mesquinhez, mas eu sempre acreditei que é na prática destes actos - mais pequenos e simples - que reside a essência de cada um de nós e, por consequência, melhor se consegue observar o comportamento humano…
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