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Pandemência

  • PJ Vulter
  • 18 de jan. de 2019
  • 4 min de leitura

Pandemência, PJ Vulter

Têm falado dessa proposta de lei do PAN (Pessoas Animais e Natureza); um vislumbre da eloquência inútil, medíocre e lírica que significa ter um partido de defesa dos direitos dos animais na assembleia da república…


Antes de mais quero deixar claro que sou defensor dos direitos dos animais, porque os animais são seres vivos que merecem ser respeitados e serem bem tratados; mas acima de tudo respeitados. Entendo que a melhor maneira de defender os animais é respeitá-los…


No entanto, esta proposta entra pelo mesmo caminho das enormidades que ultimamente têm assolado a nossa sociedade na forma de exageros; parece-me que o medo de ofender os outros, de conduzir os outros a um eventual engano, está a levar-nos no caminho da estupidificação genérica que inexoravelmente condenará as futuras gerações a relações mentecaptas e desprovidas de sentimentos e emoções…


Uau! De onde é que isto veio?!


Para já, veio de uma preocupação que tenho ouvido dos pais desta geração que está agora no secundário. Parece que os filhos não conseguem ler os Lusíadas porque levam tudo à letra; não sabem distinguir o que é uma ironia, uma metáfora… Ou seja, não sabem interpretar um texto. E a verdade é que basta estarmos atentos a essa mesma geração para perceber essa literalidade na interpretação das palavras; escritas ou faladas. Mas o que é que se passou?


As crianças perderam essa capacidade?!


Não. O sistema educacional é que não soube acompanhar os novos tempos e não soube como ensinar aquilo às crianças; não se pode esperar que as gerações que consomem imagens processem os textos da mesma maneira que nós que tínhamos de imaginar tudo na nossa cabeça. Mas não é só isso, porque o medo da ofensa e do receio de induzir em erro extraditou a ironia e a metáfora dos textos corriqueiros do dia-a-dia; que é o mesmo que dizer que os fez desaparecer do quotidiano. Por isso, como é que se pode esperar que as crianças possam entender algo que não só não foi bem ensinado como também - praticamente - não existe?


Podem dizer que isso não é grave; afinal é um problema da leitura e interpretação…


Será?


Eu tenho receio que algum dia alguém leve à letra a expressão «Vai atirar-te a um poço!»


No meu tempo, se eu dissesse isso alguém, e isso acontecesse, era porque a pessoa sofreria de algum atraso-mental; hoje em dia, não posso estar certo disso. Não posso, porque criámos - e criamos - gente incapaz de raciocinar para além do imediato; do que está à frente do nariz.


E é assim que nasce esta iniciativa do PAN; um partido político pela defesa dos animais.


Vamos lá ver uma coisa…


Eu cresci a ouvir «Atirei o pau ao gato» e não foi por isso que me tornei um agressor de gatos ou que acho que atirar um pau a um gato é uma coisa boa.


Também não entendo como é que a expressão «Matar dois coelhos de uma cajadada só» pode ser ofensiva para os coelhos; ou possa motivar as massas a matar coelhos.


E «Pegar o boi pelos cornos»?!


A sério! Não percebo onde está a ofensa para os animais nem a apologia pela agressão ao animal; até porque só um louco encararia de ânimo leve a necessidade de pegar um boi pelos cornos.


Entendo que o que aqui está em causa não são os direitos dos animais, mas um ataque às expressões idiomáticas portuguesas; e à língua portuguesa por consequência. E isto não é resultado de outra coisa se não do exagero atrás referido…


Mas falemos dos direitos dos animais; e não só...


Em primeiro lugar, os animais não entendem português; nem nenhuma outra língua. Estudos já provaram que um cão não reconhece o nome, mas o som do nome; se lhe chamarem outra coisa com a mesma entoação ele responde da mesma maneira… E, em segundo lugar: as plantas não têm direitos?!


É que na maior parte das alterações que estão a ser propostas, os animais estão ser substituídos por vegetais, hortaliças, flores… Será que o mundo botânico não tem direito a ser respeitado?!


Eu não sei… Mas tenho medo que aquele pinheiro enorme, pelo qual passo todos os dias – e se isto for aprovado – um dia me espete com uma chapada cravada de agulhas…


Agora mais a sério. O que estamos a fazer é levar a votação na AR o problema de uma minoria que se sente ofendida – eles, não os animais – com aquelas expressões idiomáticas. Ou seja, estamos a ocupar o tempo dos deputados com questões pueris quando há tanto mais para resolver…


Noutra dimensão, preocupa-me a existência do PAN. A questão desafiante é imaginá-los a vencer umas eleições. Qual será o Plano de governação? Teremos de nos tornar todos vegetarianos? Comer carne passará a ser crime? Terão os direitos dos animais sobrevalorização face aos nossos de cidadãos? Quererão dar direito de voto ao Tareco?


A própria ideia da existência de um partido para os direitos dos animais é de bradar aos céus. Que hajam grupos para defesa dos animais, aceito; criar um partido é – claro está – um exagero.


Creio que já perceberam que sou absolutamente contra esta ideia. Não só porque nela não vislumbro qualquer vantagem para os animais, pois nada se fala sobre a penalização dos maus tratos aos animais, mas também porque – mais uma vez – se fala em matar a nossa língua e, ainda por cima, sem nenhuma outra razão que não o facto de um punhado de gente se sentir ofendida com as expressões que querem assassinar.


Termino, parafraseando alguém que não conheço, mas que usou uma expressão que – parece-me – se adequa muito bem a este projecto-lei:


«A bebedeira cura-se, a ignorância educa-se, mas a estupidez… A estupidez é um problema!»

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